Maison Cannes
- Laura Valadao
- 10 de nov. de 2020
- 13 min de leitura
Atualizado: 10 de nov. de 2020
Entrei no quarto procurando desesperadamente por algum tipo de papel, e caneta. Sempre preciso de canetas. Minhas mãos tremiam – logo eu que não acredito em destino ou qualquer teoria que indique que alguma força maior me guia – mas eu não pude acreditar quando a encontrei, e onde, e como, e o que aconteceu. Eu simplesmente não pude ignorar o fato, e tive que ceder à ideia de que algumas coisas na vida não são apenas coincidências. Rapidamente encontrei um bloquinho de anotações com a logo do hotel, e escrevi ainda com a mão instável um recado para que ela pudesse me encontrar.
Elise, janta comigo?
Foi tudo o que consegui escrever, me restava agora pedir para a recepção entregar. Não seria melhor ir pessoalmente, direto ao assunto? Não. Ela ia gostar do recado, de alguma prova física de que de fato nosso encontro aconteceu.
Desci correndo as escadas do hotel, como um garoto tolo e apaixonado, e encaminhei essa tarefa para o atendente, que disse que era tão proximo ele mesmo levaria o recado. Com o coração na mão e um leve medo – minto – com um pavor da rejeição, me joguei na cama e comecei a pensar, e repassar todos os detalhes do nosso encontro….
§
Fiz meu check in no Hôtel Le Pavillon Des Lys, deixei minha mala no quarto e pensei em aproveitar a tarde andando pela cidade. O vento uivava a cada esquina que eu virava, um vento frio e húmido que vinha do rio. Algum tempo depois me vi em frente ao Chateau D’Amboise, um dos castelos mais famosos do vale, onde fica a capela com o túmulo de, nada mais nada menos que, Leonardo da Vinci.
Paguei meu ticket e subi uma grande rampa em direção ao castelo, meus olhos lacrimejavam com o vento que parecia ainda mais forte ali. Eu estava começando a me arrepender de não ter levado um casaco mais pesado, estava apenas com um terno de lã. Passei pela capela pra escapar do frio e fui direto para a estrutura principal do castelo. Ao me aproximar da porta já senti o calor que emanava de dentro que com certeza provinha de uma lareira, e do calor humano dos turistas.
Esse é um dos castelos do Vale que é decorado: tapeçarias, camas, armaduras, tudo o que uma pessoa que ama história gosta. Olhando ao redor vi vários casais, algumas famílias com seus filhos, e claro os vigias, que ficam ali para que ninguém ouse tocar na decoração.
Passei para o segundo cômodo, o terceiro, e quando eu estava prestes a subir uma escada em espiral quase claustrofobia eu dei de frente com a pessoa que estava descendo.
“Desculpa, pardon” ela disse. Eu não conseguia enxergar claramente, meus olhos ainda estavam se ajustando à penumbra das escadas, mas eu reconheceria aquela voz, aquele cheiro, em qualquer situação. Elise. Qual é a chance?
“Elise?” Foi a única palavra que saiu da minha boca. Ela arrumou o casaco e cachecol, passou a mão no cabelo pegando a única mecha que estava fora do lugar colocando-a atrás da orelha.
“Davi?” Ela lembra de mim. “Davi! Não acredito!”
Eu fiquei parado olhando pra ela, não conseguia assimilar o que estava diante dos meus olhos. Sempre achei que nunca mais iria encontrar Elise. Ela terminou com o meu melhor amigo Igor para estudar fora quando tínhamos dezessete anos, e desde então ela nunca mais deu notícia.
Éramos bons amigos, aliás, mais do que isso. Sinceramente foi um choque pra mim quando ela aceitou namorar com ele, eu sempre achei que ela gostava mais de mim, mas a vida me mostrou que eu não entendo nada do que se passa na cabeça das mulheres. Mulheres não…Elise.
Ela não se enquadra no perfil de pessoas que gostam de redes sociais, não, não. Ela sempre foi romântica, misteriosa. Foi a pessoa mais importante na minha vida durante os anos de ensino médio e de repente ela sumiu, nunca mandou notícias ou voltou pra visitar.
“Davi?” Ela falou acenando a mão, tentando quebrar meu olhar fixado nela. Eu pisquei e voltei pro momento balançando a cabeça, deixando o passado vir aos poucos, controlando a barragem de sentimentos.
“Elise, que mundo pequeno…” cada palavra que saia da minha boca era um arrependimento, eu não sabia o que falar ou fazer.
“O que você está fazendo aqui!?” a única coisa que me consolava era o rouge que estava se fazendo presente em suas bochechas, não sei se ela estava tão sem graça quanto eu, ou com frio.
“Você tá sozinho?!”ela perguntou esfregando uma mão na outra pra se aquecer. Direta ao ponto, como sempre.
“É… sim, estou de passagem por algumas cidades do vale” respondi pausadamente,“E você? Viajando sozinha?”
Ela sorriu. Eu nem sabia o que era saudade até esse momento.
“Eu trabalho aqui! Vem, deixa eu te mostrar uma coisa” ela disse empolgada, pegando minha mão para me guiar subindo as escadas. Naquele momento senti como se nenhum dia tivesse se passado, éramos aqueles jovens de dezessete anos de novo e as quase duas décadas sem se ver não existiram.
“Sabe,” ela subia de dois em dois degraus “eu estava sentindo que algo iria acontecer hoje, e olha que coincidência…encontrar meu primeiro amor numa cidade do interior da França, e não só isso, dentro do castelo onde eu trabalho…” ela falou ofegante apertando minha mão, que agora estava suada de nervoso.
“Seu primeiro amor?” Eu ri, sem olhar pra cima. “Você deve estar me confundindo com o Igor” bufei, sem graça claro. Mas é claro que ela tinha me confundido.
“Você está subestimando minha memória ou pescando declarações, um dos dois” ela disse brincando e séria ao mesmo tempo. Sempre me deixando perdido.
Eu senti um vento frio bater no meu rosto quente de vergonha, de saudade, de dúvida. Tínhamos chegado ao topo de uma das torres que tinha a vista do rio do Loire, que refletia o céu em tons de lilás e azul. Eu não sei se era o momento, a companhia, o ocorrido, mas eu me emocionei ao contemplar o cenário. Em segredo, é claro.
“Perfeito, não é?”
“Sim, tudo hoje está perfeito” respondi voltando o olhar pra ela. Definitivamente dois adolescentes.
Um walkie talkie chiou quebrando o silêncio, ela atendeu o chamado em Francês, e respondeu “J’arrive!”
“Tenho que ir” ela disse, em um movimento rápido e inesperado senti seus lábios quentes nos meus, suas mãos frias apertando nas minhas bochechas. Sem pensar eu a puxei bruscamente para perto de mim, um movimento involuntário, e automático, como o bombear do coração. Ela desceu as mãos pro meu peito e me empurrou sem dizer uma palavra, e foi embora. Vai atrás dela. Eu fiquei imóvel, estupefato, no topo da torre de um castelo. Se eu pudesse assistir essa cena como terceira pessoa com certeza o faria. Repetidamente.
Desci lentamente as escadas e terminei de explorar o castelo passando finalmente pela capela, e jardins, sempre procurando por ela. Na saída perguntei por Elise na portaria, a senhora simpática que estava no turno me respondeu que ela sairia mais tarde, mas que se eu quisesse eu poderia deixar um recado que ela se comprometeria a entregar. Eu recusei, sem pensar.
“Ah, tudo bem, deixa pra lá”
Já estava escurecendo quando cheguei no hotel, meu estado entorpecido se transformando em algo parecido com desespero e falta de ar. Subi correndo pro quarto. Papel e caneta, papel e–
§
Depois de algumas horas que pareceram uma eternidade o telefone tocou. Pulei da cama em reflexo e atendi ofegante.
“Sim!?”
“Monsier Davi, tem um recado para o senhor na recepção” o recepcionista falou entediado, claramente não era o jovem do turno da tarde, e claramente eu teria que descer para descobrir a resposta.
Resolvi me arrumar antes de descer, já estava tarde e independente da resposta eu teria que sair pra jantar de qualquer forma. Desci lentamente as escadas dessa vez, peguei o envelope, fingindo frieza, e me dirigi ao bar pronto pra comemorar –ou afogar minhas mágoas. O recado era pequeno, quatro palavras, e mais mistério.
Cannes, 21h
Te espero!
“Como assim? Cannes?” falei comigo mesmo. “Estamos em Amboise, não em Cannes…” Porque ela tem que ser assim?
“Monsier, o que é Cannes?” perguntei pro bartender “Eu sei que é uma cidade no sul, mas não tem a menor chance de eu chegar lá em uma hora” terminei de me explicar mostrando o recado para ele, antes que ele me achasse ignorante em geografia.
“É uma Maison…” ele respondeu seriamente, enquanto secava um copo de whiskey.
“Ah sim, e onde fica?”
“Pergunte ao concierge, ela te mostra no mapa. Quer beber algo?”
“Sim, uma dose dupla de whiskey, sil vous plait” falei tentando aliviar o clima.
Com o mapa em mãos eu comecei minha caça ao tesouro. Essa foi boa. Balancei minha cabeça sorrindo, me sentindo um menino de novo. Já estava escuro, a cidade já estava vazia pois a maioria dos turistas vêm somente para passar o dia. Segui as instruções que a concierge desenhou no mapa com uma caneta vermelha, que me levavam cada vez mais para o topo, em ruas cada vez menores, o vento cada vez mais frio. Mais algumas doses de whiskey teriam caído bem.
Me deparei com uma casa, no topo da cidade –uma casa não, uma mansão. Me aproximei do pesado portão de ferro apertando os olhos para enxergar melhor. Um corredor de murtas verdes precisamente aparadas mostravam o caminho da porta do que me parecia um castelo em miniatura. Três andares, uma porta central de duas folhas, e uma torre em cada lado com o telhado pontudo e alto. Nada mal Elise, nada mal.
Dei alguns passos pra trás, tentando absorver todo o cenário. No largo pilar de pedra vi uma placa, Maison Cannes. Tentei empurrar o portão sem muito sucesso, olhei as horas no meu relógio, faltavam dez minutos para o horário, resolvi esperar.
O portão abriu sem eu tocar em nada, às nove da noite, em ponto. Não vi nenhuma câmera de segurança, mas sabia que estava sendo observado. O barulho rude do portão me deu um arrepio na nuca. Soltei um sorriso tímido de nervoso. Você está sendo observado. Arrumei minha postura estufando o peito seguindo em frente, ouvindo apenas o barulho dos meus passos nas pedras que pavimentavam o caminho, parecia que até o vento tinha parado de uivar.
Eu estava na metade do caminho quando uma folha das portas se abriu. Elise agora estava de cabelos soltos, sem cachecol, sem casaco, apenas um vestido preto de veludo. A escuridão formava uma moldura que destacava seu pescoço e rosto como um busto de mármore, uma obra de arte.
“Boa noite, Elise” Não me canso de falar esse nome.
“Que bom que você aceitou meu convite” ela respondeu sorrindo, quase mostrando os dentes. Como assim? Eu que te convidei. Fiquei na dúvida, resolvi perguntar.
“Como assim, você me convidou?”
“Sim, eu vi você entrando no Le Pavillon e deixei esse recado na recepção, eu não sabia o número do seu quarto” Será que o recepcionista vespertino não tinha entregue meu recado? Ou a senhora simpática da portaria do Chateau?
“Mas eu te mandei um recado, te convidando para jantar hoje, bem mais cedo…você não recebeu?” Falei enquanto dava meus últimos passos até chegar nela.
“Não, não fiquei sabendo de nenhum recado” ela disse olhando no fundo da minha alma “Mas que bom, que tudo deu certo apesar desse desleixo. Entra…”
O interior da casa não era tão assustador quanto o lado de fora. Não prestei muito atenção na decoração, meus olhos estavam seguindo apenas Elise. Ela me guiou para a sala de jantar, dois lustres rústicos pairavam sobre uma longa mesa emanando uma luz amarelada, agradável.
“Bela casa” falei sorrindo, mais uma vez sem graça, “bem conhecida pela cidade…” Como será que ela conseguiu morar aqui…
“Eu me casei com um…vamos dizer” ela pausou me deixando com uma dor na boca do estômago “ um lord” concluiu.
“Você… você está atualmente casada?”
“Realmente importa o que eu responder aqui, agora? Você vai sair correndo?”
Eu não conseguia tirar os olhos dela, era como se eu estivesse hipnotizado. Ela sempre foi loira de sol, mas agora o cabelo estava natural, mais escuro e mais ondulado. Ela sabia o poder que tinha sobre mim, mesmo eu tentando meu melhor pra disfarçar.
Certa vez quando éramos jovens chegamos bêbados de uma festa e dormimos na mesma cama, antes de dormir ficamos um de frente para o outro se olhando, sem dizer nada. Nesse dia mapeei todas as cores existentes em sua iris, os tons de marrom e amarelo. E era esse olhar, esse olhar que…
“DAVI!” Ela gritou, “Você aceita algo pra beber?” Ela perguntou quando voltei pro momento.
“ehhh, sim, whiskey?” Será que o marido dela está em casa?
Até o momento eu não tinha visto ninguém além dela, a mesa de jantar estava posta, um lugar na cabeceira da mesa e o outro a direta. Somente dois lugares.
“Estamos sós…” ela disse, lendo meus pensamentos.
Ótimo, jantar com ela e o marido seria a única situação em que eu sairia correndo. Nós brindamos nossos copos e viramos, sedentos. Como nos velhos tempos.
Nós jantamos, bebemos mais, e no meio da conversa eu peguei a mão dela no ar quando ela estava articulando. Ela parou de falar e me olhou com espanto.
“Elise, o que você disse hoje mais cedo, sobre seu primeiro amor, você estava falando sério?” Eu sei que eu tinha quebrado o clima descontraído, mas não aguentava mais, eu só queria beija-lá em todas as partes imagináveis.
“Sim... Por que o choque?”
“Por que então você escolheu o Igor?” Sempre quis saber.
“Porque você nunca disse, ou fez absolutamente nada mesmo eu claramente te dando sinais. O Igor viu isso e esperto como ele era tomou a atitude de me pedir em namoro, e mesmo assim você não disse nada…continuei achando que você só flertava comigo, mas não passava disso”
“Por que você me beijou hoje?”
“Porque eu quis”
“Você é casada!” minha voz saiu mais ríspida do que eu planejava.
“Viúva” ela disse abaixando o tom de voz, mas o olhar não correspondia com o que ela acabara de dizer.
“Você se casou com um velho?” Senti meu tom ficar agressivo, possessivo. Se controla. Ela se levantou arrancando a mão da minha.
“Me desculpa, desculpa” implorei imediatamente, colocando meu guardanapo na mesa e me levantando calmamente. Ela estava de costas pra mim, olhando para ela mesma em um espelho enorme com moldura de madeira entalhada.
“Por que essa raiva agora?” Ela quebrou o silêncio, me olhando pelo espelho.
“Não sei… A raiva é de mim mesmo. Raiva e arrependimento, se eu soubesse que voc…” eu disse baixinho abraçando-a por trás minha face mergulhada em seus cabelos.
“Você sempre foi covarde” Elise me interrompeu, a triste verdade amargou minha boca. “Sempre quis que você tomasse uma atitude, mas não. Nem no amor você decidia nada, tudo na sua vida foi decidido por você…” Por que ela estava me tratando assim?
Um nó se formou na minha garganta e foi descendo para minhas entranhas, a tristeza se transformando em auto desprezo. Minhas mãos subiram do abraço na cintura para os cabelos, abri os olhos para ver nossa reflexão no espelho, pra tentar ler alguma expressão de aprovação no rosto dela, mas não consegui decifrar nada, como sempre. Não dessa vez.
Fechei a mão entrelaçando meus dedos em seus cabelos puxando sua cabeça levemente pra trás, de modo que nossos rostos estavam agora se tocando, eu conseguia sentir o calor de seu corpo, sua respiração acelerada. Ela soltou uma risada baixa e cínica, me desafiando.
“Covarde”
Tumtun…
Tumtun…
Tumtun.
Tudo o que eu conseguia ouvir era o barulho do meu coração pulsando, minha mão tremia apesar de firmemente rasgar o vestido de veludo com se eu estivesse rasgando uma folha de papel. Olhei para suas costas nuas e depois para o espelho, pro rosto dela.
Agora sim, o olhar que eu procurava.
§
No dia seguinte acordei ainda meio embriagado de tudo: de álcool, de paixão, e até mesmo de ilusão. Ilusão de que agora nós iriamos ter uma chance de ficar juntos. Elise abriu os olhos e por alguns minutos ficamos se olhando, sem falar nada, assim como naquela noite anos atrás.
O barulho tenebroso do portão quebrou nosso olhar, o desespero e surpresa nos olhos dela me preocupou. Ela levantou como um raio, correndo até a janela.
“O que foi?” perguntei me levantando, procurando com o olhar onde estava minha roupa.
Ela voltou correndo, abriu a gaveta do móvel de madeira entalhada ao lado de sua cama e tirou uma arma conferindo se estava carregada.
“Você não disse que era viúva Elise?” falei em alto e bom tom enquanto me vestia, mas já desconfiando da resposta. Ela revirou os olhos.
“Se eu tivesse contado toda a verdade você teria ido embora antes do jantar…” ela falava enquanto corria pelo quarto, arrumando a cama, escondendo o vestido rasgado.
“Por que você fez isso?”
“Por que eu te amo, seu imbecil…” ela disse terminando de abotoar uma camisa branca.
Eu nem consegui apreciar a declaração que ela acabara de fazer, meus olhos arregalados só conseguiam ver os hematomas no pescoço dela, que pra mim era um sinal de que a noite passada realmente aconteceu, uma prova de amor –e com certeza o marido dela iria ver.
“Elise, pra quê a arma?” apontei pra arma carregada em cima da cama. Ela pegou a pistola e veio até mim, colocando o objeto frio em minhas mãos.
“Meu marido não é um Lord…eu não tenho tempo de explicar” ela disse com a voz estranhamente calma, “agora não é hora de ser covarde Davi, preciso de você, você tá me ouvindo?”
“O que você quer que eu faça?” perguntei tentando reviver minha braveza e finalmente lutar por ela.
“Eu quero que você mate ele”
Eu fiquei congelado no momento, sem saber o que responder, a porta do quarto se abriu e uma descarga de adrenalina percorreu meu corpo, o tempo parou por alguns instantes.
O homem que entrou não era nada do que eu havia imaginado. Ele era mais alto do que eu, nariz grande, sobrancelha marcada, e olhos tão azuis que pareciam quase cinza. Apesar das rugas, do cabelo revelando alguns fios grisalhos, ele era grande e forte. Ele estava usando um terno black tie, como se estivesse chegando de uma festa de gala, mas o que mais me chamou a atenção foi a arma na mão dele. Ele sabia que eu estava aqui.
Ele olhou pra Elise, depois pra mim, passou a mão que estava livre no cabelo e sem nenhum remorso atirou em mim, mirando no peito.
Tudo estava acontecendo em camera lenta, o sangue quente escorrendo do furo no meu ombro, o marido de Elise enforcando ela na cama, um tinido no meu ouvido. Minha visão estava turva, tudo girava.
Covarde. A palavra ecoava na minha cabeça.
Eu vi a arma que Elise tinha me entregue no chão. Com as mãos vermelhas de sangue segurando a pistola eu respirei fundo, tentando focar. Se eu errar posso matar ela.
Quando ela viu que eu estava com a arma na mão ela parou de espernear, demonstrando total confiança em mim. O Lord ainda com as mãos no pescoço dela estranhou o silêncio e olhou pra mim.
Eu apertei o gatilho…
Repetidamente.
§
Depois daquele dia eu nunca mais duvidei do destino. Assim que eu entrei pelo portão da mansão Cannes eu sabia que tudo iria mudar, mas eu não sabia como. Depois que Elise me contou toda a história eu liguei os pontos percebendo que todos da cidade sabiam quem ela era, e com quem era casada.
Estamos foragidos não só da polícia mas também de toda a máfia da região do Loire. Sim –o covarde aqui, eu matei o poderoso chefão. Era com esse tipo de “Lord” que Elise tinha se envolvido. É uma questão de tempo até que nos encontrem, estamos vivendo como nômades, a vida nunca mais será entediante, sem paixão.
Comments